sexta-feira, 21 de março de 2008

Sexta Feira Santa

Mãe, por algum motivo Sexta Feira Santa se parece com você.
É uma data séria e grave. Não que você fosse assim, mas porque sempre respeitou as coisas sérias e graves.

Hoje você estaria fazendo considerações sobre a morte de Cristo, sobre a proximidade do seu retorno à Terra para dar início ao esperado"fim do mundo". Então você lamentaria o cambalear errante da raça humana nesse mundo desencantado. Então lhe viria à mente e aos lábios que a que a vida é breve e que suas dores logo passariam. Nesse momento o cilco se fecharia e você voltaria novamente seus olhos para o céu, para longe daqui.

Hoje reuniríamos a família para uma lasanha mas você mencionaria uma caldeirada de peixe com pirão. Lembraria enternecida das caldeiradas que sua mãe fazia, o quanto eram mais cheirosas e gostosas que as de hoje em dia e que nunca mais provou nada igual. Então concluiria que o passado, seus gostos momentos e cores são irrecuperáveis. Isso talvez a deixasse um pouco melancólica.

Sinto saudades das canções antigas que você evocava nessa época: as músicas de ressurreição com todos os comentários tocantes ... e tudo o mais que você sempre trazia à tona para que jamais fosse esquecido.

Você me tomava pela mão e me encaminhava a coisas superiores, excelentes e sagradas. E eu me sentia especial por ser sua filha. Me sentia especial por partilhar de suas emoções e expectativas escatológicas.

Tudo em que você acreditou foi de todo o coração.

Você era intensa. Continua sendo: intensamente lembrada, intensamente amada, intensamente morta. E contraditoriamente viva... Mas de qualquer forma, longe de mim.

Cristina Faraon