terça-feira, 17 de julho de 2007

Primeira Parte

Nem importa mencionar em qual ano nasci.

É estranho olhar minha própria história como sendo toda localizada no passado - nada no presente.

Minha história acabou. Nem sei se fui boa ou má, feliz ou infeliz, bela ou feia. Existi e amei. Deixei amigos, sonhos realizados e irrealizados. Contagiei pessoas com meus sonhos mais bonitos. Não sei com certeza se consegui mudar alguma coisa no mundo. Talvez sim.

Meu pai me amava e eu amava meu pai. Filha única em meio a tantos rapazes. Sentia-me só frequentemente. Minha mãe trabalhava muito, noite e dia. Era uma boa mãe, mas limitada. Estudo pouco, tristezas muitas. Mesmo amada era uma mulher só e poucas vezes compartilhava conosco as coisas de seu coração. Acho que me amava. Internou-me em colégio de freiras para que eu fosse mais fina e bem aceita em sociedade do que ela. Talvez não soubesse bem o que fazer comigo. As pessoas sempre acham mais fácil cuidar de meninos.

Naquele colégio havia hora para tudo. Naquele tempo aprendíamos a bordar, tocar, costurar... Eu tocava piano mas minha família, exceto meu pai, não valorizava muito isso. Durante anos contei a meus filhos como eram os recitais, como eu mesma fazia meu vestido especial para as apresentações, como eram bonitos aqueles momentos ainda que minha família não os valorizasse.

Conquistei muitas amizades durante a vida. Depois de moça fui a muitas festas. Eu adorava dançar, conversar, rir. Foram bons tempos, tempos românticos e ingênuos, pelo menos em minhas lembranças. Lembro-me das vezes que ainda moça eu confeccionava os vestidos de festa de minhas amigas mais pobres. Décadas depois, já envelhecida, lagrimei muitas vezes quando lembrava dessa época. Parecia não haver grandes problemas. Existiam dores e mágoas mas tudo me parecia tão mais leve do que a vida das décadas seguintes! Eu amava as orquestras, os vestidos trabalhados, os namoros na porta, chapéus, luvas, boca vermelha. Eu adorava também dançar.

Fui feliz em minha juventude, vaidosa, cercada de amigos. Acho que eu tinha um grande coração.

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